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Cláudio Castro usa sangue e caixões como palanque para 2026

Cláudio Castro rejeitou recursos federais e a PEC da Segurança Pública, mas culpa o governo Lula pelo caos no Rio.

Cláudio Castro
Cláudio Castro transforma o medo em palanque eleitoral e usa o sangue nas ruas como vitrine para sua campanha ao Senado em 2026. Foto: Márcia Foletto / Agência O Globo

As cenas que voltaram a dominar o noticiário nesta terça-feira (28) no Rio de Janeiro — tiros cruzando o céu, barricadas erguidas, escolas fechadas e comunidades em pânico — parecem um déjà-vu de uma tragédia sem fim. Quinze anos depois da operação que prometia pacificar o Complexo do Alemão, o Estado fluminense revive o mesmo roteiro: operações policiais espetaculares, números de mortos que assustam e a ilusão de que o confronto armado é sinônimo de segurança. O que muda, na prática, é apenas o protagonista — agora com o governador Cláudio Castro (PL), que faz da guerra o palco da sua próxima ambição política: uma cadeira no Senado em 2026.

Castro tenta vender a imagem de gestor firme, disposto a enfrentar o crime organizado. Mas por trás do discurso, há uma política de segurança pública falida, movida por populismo e por cálculo eleitoral. O governador e seus aliados de extrema direita transformam a violência em espetáculo e o medo em combustível político. A cada operação, os números são exibidos como troféus — dezenas de mortos, centenas de fuzis apreendidos — enquanto o problema real continua sem solução. O resultado é uma rotina de pânico nas comunidades e um Estado que naturaliza o horror como método de governo.

A falsa guerra que alimenta o medo

O Rio de Janeiro vive há décadas um conflito não declarado, em que as fronteiras entre crime e Estado são turvas. Facções e milícias dominam territórios inteiros, impondo regras, controlando o comércio e decidindo quem vive e quem morre. Diante dessa realidade complexa, o governo responde sempre da mesma forma: com mais armas, mais operações e mais mortes. A diferença é que, agora, o massacre vem embalado em discurso moralista e propaganda oficial.

Cláudio Castro não combate o crime; ele o usa como justificativa. Sua política se sustenta na manutenção do medo coletivo — quanto maior o pânico, mais espaço para o discurso da força e da autoridade. Não é à toa que o governador se nega a investir em soluções estruturais. Em 2023, recusou R$ 174 milhões enviados pelo Fundo Nacional de Segurança Pública, dinheiro que poderia fortalecer ações de inteligência, integração policial e programas de prevenção. Também rejeitou a PEC da Segurança Pública, que propõe justamente a integração entre União, estados e municípios.

Mesmo assim, foi à TV chorar e acusar o governo Lula de “abandono”, como se sua gestão não tivesse ignorado, por escolha própria, as ferramentas para mudar o cenário. É o retrato do oportunismo político: cria o problema, amplifica o medo e depois se apresenta como vítima da própria incompetência.

Operações que matam e não resolvem

A operação desta semana deixou um saldo de dezenas de mortos, transportes paralisados, milhares de crianças fora da escola e moradores encurralados pelo tiroteio. O caos foi total. Mas, para o Palácio Guanabara, a tragédia virou narrativa. Nas redes sociais, apoiadores celebraram o número de “criminosos abatidos”, enquanto famílias enterravam seus mortos e comunidades contabilizavam o prejuízo.

Essas operações não enfraquecem o tráfico — apenas o remodelam. A cada morte, uma nova liderança surge. A cada fuzil apreendido, mais armas chegam pelas mesmas rotas que o Estado finge não ver. O que se destrói, de fato, é a confiança entre a população e as instituições. A cada incursão policial desastrada, o Rio se distancia um pouco mais da paz e mergulha na descrença de que é possível viver sem guerra.

Corpos
O Rio revive o mesmo ciclo de violência de 2010, provando o fracasso da política de segurança pública.
Foto: FABRICIO SOUSA/Agencia Enquadrar/Folhapress

O populismo da bala e o palanque da dor

Castro aprendeu rápido a usar a política da bala como plataforma. Vice de Wilson Witzel, o ex-governador que ganhou notoriedade por comemorar execuções em helicópteros e quebrar a placa de Marielle Franco, ele herdou o mesmo estilo: transformar o confronto em palanque e o sangue em símbolo de força.

Hoje, o governador tenta ocupar o espaço deixado por Witzel com a mesma retórica da extrema direita: “bandido bom é bandido morto”. A lógica é simples e cruel — o confronto permanente mantém o eleitorado conservador mobilizado, e o medo se torna o principal ativo eleitoral. Não importa que, nesse processo, trabalhadores fiquem presos em casa, crianças sem aula e famílias sem paz. O que vale é a manchete do dia seguinte e o vídeo editado para circular nas redes.

A farsa, no entanto, se revela nos bastidores. Um dos aliados de Castro na Assembleia Legislativa é TH Jóias, acusado de tráfico de armas, e seu ex-secretário de Transportes, Washington Reis, é investigado por envolvimento com o crime organizado. Reis, aliás, é figura próxima à família Bolsonaro — o mesmo grupo político que impulsionou Castro ao poder. Como falar em “combate ao crime” quando os próprios aliados políticos transitam entre o poder e o submundo?

Segurança se faz com presença, não com balas

Uma política de segurança pública eficaz não se mede por cadáveres, mas por vidas preservadas. O que o Rio precisa é de presença do Estado nas favelas e periferias — mas presença real, com educação, saúde, cultura, moradia e oportunidades de trabalho. Enquanto o Estado só chegar com a polícia, o tráfico continuará sendo a única instituição percebida nesses territórios.

A segurança pública deve ser tratada como um direito coletivo, não como espetáculo televisivo. É preciso investir em prevenção, inteligência e inclusão social. Nenhum fuzil substitui o poder transformador de uma escola ou de um emprego digno. A paz não se impõe pelo medo, mas se constrói pela justiça.

O teatro do poder

O que Cláudio Castro encenou nesta semana não foi uma operação de segurança — foi um ato de campanha. Enquanto o povo se escondia do fogo cruzado, ele posava como herói nas câmeras. O governador não quer pacificar o Rio; quer se projetar nacionalmente como o novo rosto da direita punitivista, o candidato que “não tem medo de enfrentar o crime”.

Mas o que ele realmente enfrenta é a própria incapacidade de governar. Seu legado, até aqui, é o de um Estado em colapso, uma população refém do medo e uma política construída sobre cadáveres. Cláudio Castro aposta no desespero coletivo porque sabe que a paz não dá voto.

O sangue que escorre das vielas do Alemão e da Penha é o retrato de um governo que escolheu o confronto em vez do diálogo, o marketing em vez da gestão, o palanque em vez da responsabilidade. No fim das contas, a única guerra que ele parece travar com sucesso é a guerra pela própria sobrevivência política.

A pergunta que não quer calar: Quantos caixões mais o governador precisará empilhar para sustentar seu projeto de poder?

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