Castramóvel parado há 1 ano expõe abandono, desorganização e prioridades distorcidas da gestão municipal
(Foto: Divulgação)
A paralisação do castramóvel em Jaboatão dos Guararapes, na Região Metropolitana do Recife, há cerca de um ano, tem provocado questionamentos de protetoras independentes, organizações da sociedade civil e moradores do município. O tema ganhou visibilidade com a convocação de um protesto marcado para esta segunda-feição (22) às 10h em frente a estação do metro de Jaboatão, organizado por protetoras da causa animal.
No centro do debate estão a execução do orçamento público destinado ao bem-estar animal, a redução de recursos prevista para o próximo ano e a dependência de emendas parlamentares para a realização de castrações no município.
Em Jaboatão dos Guararapes, a política de bem-estar animal tornou-se um retrato fiel da má gestão pública: orçamento previsto, ações inexistentes e silêncio institucional. Sob a administração do prefeito Mano Medeiros, o que se vê é uma combinação de omissão, falta de planejamento e abandono deliberado de uma pauta que afeta diretamente a saúde pública e a dignidade dos animais.
Orçamento previsto para o bem-estar animal
De acordo com a Lei Orçamentária Anual (LOA), a gestão e execução de ações de proteção animal estavam orçadas em R$ 1.677.248,00. Também constavam recursos para a ampliação do Programa Pet, no valor simbólico de R$ 1.000,00, e para a estruturação da gestão e execução do Programa de Bem-Estar Animal, com apenas R$ 10.000,00. Mesmo com esses valores previstos, o Castramóvel permanece parado há um ano, evidenciando que o problema não é a inexistência de orçamento, mas a incapacidade ou falta de vontade política para executá-lo.
A situação se agrava quando se observa que serviços básicos também foram interrompidos. A UBS veterinária de Cavaleiro, chegou a ficar parada por cerca de seis meses, retomando os atendimentos apenas em Junho, após forte pressão das protetoras. Nada foi restabelecido por iniciativa espontânea da gestão municipal, mas sim por cobrança popular.
Redução de recursos para o próximo ano
Como se não bastasse o cenário atual, a prefeitura projeta um retrocesso ainda maior para o próximo ano. O orçamento destinado ao bem-estar animal sofrerá uma redução significativa, caindo de quase R$ 1,7 milhão para cerca de R$ 1.185.000,00, o que confirma que a pauta segue fora das prioridades do governo municipal. Menos recursos significam menos castrações, menos prevenção e mais abandono.
Especialistas em políticas públicas apontam que reduções orçamentárias em áreas preventivas, como a castração, tendem a gerar custos maiores no médio e longo prazo, incluindo problemas de saúde pública e aumento do abandono animal.
Crescimento do abandono em feiras livres
E o abandono já é visível. Ele cresce de forma alarmante, especialmente nas feiras livres, com destaque para a Feira de Cavaleiro, onde o descarte de animais tornou-se recorrente. Coincidentemente — ou não — trata-se de um local sem câmeras de monitoramento, o que favorece a impunidade.
É impossível não questionar: onde estão os equipamentos prometidos e os recursos destinados para coibir esse crime? Em 2023, o deputado Romero Albuquerque (União Brasil) destinou emenda parlamentar para a instalação de câmeras em pontos estratégicos de abandono animal. Onde esse dinheiro foi aplicado? Onde estão as câmeras? Em 2024, o vereador Vilmar também solicitou formalmente a instalação desses equipamentos, e novamente nenhuma ação concreta foi executada pela prefeitura.
As protetoras afirmam que não recebem apoio regular da prefeitura, como fornecimento mensal de ração ou subsídios permanentes, o que torna a atividade de proteção animal financeiramente insustentável para muitas delas.
Relatam ainda o aumento do abandono de animais na Feira de Cavaleiro. O local não conta com câmeras de monitoramento, o que dificulta a identificação de responsáveis por maus-tratos e abandono, prática considerada crime pela legislação brasileira.
Atendimento dependente de emendas parlamentares
Com a paralisação de serviços municipais, parte do atendimento de castração passou a ocorrer por meio de emendas parlamentares, destinadas a organizações da sociedade civil. Uma dessas entidades é a ONG Quem Ama Castra, que recebeu recursos via emendas para executar castrações em períodos específicos.
Esse modelo, embora legal, levanta debates sobre a fragmentação da política pública. Jaboatão dos Guararapes possui sete regionais administrativas, mas o atendimento por emendas tende a alcançar áreas e públicos específicos, sem garantir cobertura uniforme em todo o município.
Crescimento do abandono em feiras livres
Protesto organizado por protetoras
O protesto marcado para esta segunda-feira (22) é liderado pela protetora Fátima Santos, moradora do bairro de Cavaleiro. Ela mantém atualmente mais de 100 animais sob sua guarda, segundo informações divulgadas pelas organizadoras do ato.
Falta de cadastro e diálogo institucional
Outro ponto levantado é a ausência de um cadastro municipal ativo de protetoras e ONGs, o que dificulta a formulação de políticas públicas integradas. Desde a mudança na Secretaria de Meio Ambiente, com a exoneração da então secretária Paula Francelino, protetoras relatam que não houve reuniões formais com a nova gestão.
As demandas foram encaminhadas ao gerente executivo de Bem-Estar Animal, Breno Alves, mas, segundo as protetoras, ainda não houve apresentação pública de cronograma ou plano de retomada das ações.
Enquanto isso, cresce a percepção popular de que o prefeito Mano Medeiros deslocou sua atenção da gestão da cidade, concentrando esforços na pré-campanha da primeira-dama, Andréia Medeiros, pré-candidata a deputada estadual. Em contrapartida, o abandono animal avança, e protetoras e ONGs seguem sem cadastro, sem apoio institucional e sem políticas públicas permanentes que reconheçam o trabalho que realizam diariamente.
A omissão também se manifesta na falta de divulgação do programa federal Sin Patinhas, que poderia ampliar o cadastro de animais e garantir mais recursos da União para o município. Ao ignorar essa ferramenta, a gestão municipal abdica de recursos e reforça o desinteresse por soluções estruturais.
O diálogo com as protetoras foi rompido com a mudança na Secretaria de Meio Ambiente, nenhuma reunião foi realizada com as protetoras que continuam sem respostas objetivas, cronograma de ações ou transparência.
O que Jaboatão dos Guararapes vive hoje não é apenas desorganização administrativa. É uma péssima gestão do bem-estar animal, marcada por orçamento não executado, serviços paralisados, redução de recursos, abandono crescente e desprezo por quem está na linha de frente cuidando de vidas.
Posição da gestão municipal
A Prefeitura de Jaboatão dos Guararapes ainda não divulgou nota detalhada explicando os motivos da paralisação do castramóvel, o cronograma de retomada ou a aplicação específica de recursos destinados ao monitoramento por câmeras.
Em gestões públicas, a execução orçamentária pode ser impactada por fatores como processos licitatórios, entraves administrativos e readequações financeiras, pontos que também fazem parte do debate e precisam ser esclarecidos de forma transparente.
Conclusão
A paralisação do castramóvel em Jaboatão dos Guararapes evidencia desafios recorrentes na execução de políticas públicas de bem-estar animal. Embora haja previsão orçamentária, a ausência de serviços contínuos, a redução de recursos futuros e a dependência de emendas parlamentares levantam questionamentos legítimos da sociedade civil sobre a efetividade da gestão pública nessa área.
O protesto organizado por protetoras amplia o debate público e reforça a necessidade de maior transparência, diálogo institucional e planejamento de longo prazo. O tema envolve não apenas a proteção animal, mas também questões de saúde pública, responsabilidade fiscal e gestão eficiente dos recursos públicos.
O desfecho dependerá da capacidade do poder público de apresentar informações claras, retomar serviços essenciais e construir políticas que atendam de forma equitativa as sete regionais do município, garantindo continuidade e acesso universal às ações de bem-estar animal.
Jaboatão precisa escolher:
vai continuar fingindo que cuida dos animais — ou vai assumir, de fato, sua responsabilidade pública?

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