O MPE pediu reforma parcial da sentença em Escada ao isentar a federação PSDB/Cidadania e manter a acusação de fraude à cota de gênero contra o AGIR.
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| TRE-PE avaliará nova interpretação que pode modificar efeitos da decisão sobre as eleições de 2024. Na fotografia os vereadores Tarlina Patrícia e Marcio da Água do PSDB. Fotos: Divulgação |
O Ministério Público Eleitoral (MPE) apresentou ao Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco (TRE-PE) um parecer que altera substancialmente o alcance da sentença proferida pela juíza da 19ª Zona Eleitoral de Escada sobre a suposta fraude à cota de gênero nas eleições municipais de 2024. Embora concorde com a existência de fraude cometida pelo partido AGIR, o MPE pontua que a Federação PSDB/Cidadania não descumpriu a cota legal, diferentemente do que havia sido decidido em primeira instância.
A análise, contida no processo 0600477-94.2024.6.17.0019, pode modificar os efeitos eleitorais da sentença, especialmente no que se refere à validade dos votos atribuídos à federação. Já para o partido AGIR, o MPE sustenta que há provas contundentes de que candidaturas femininas foram usadas apenas para cumprir formalmente a legislação, sem intenção real de concorrer.
Cumprimento da cota de gênero pela Federação PSDB/Cidadania
A juíza da 19ª Zona Eleitoral havia considerado que tanto o AGIR quanto a Federação PSDB/Cidadania haviam praticado fraude à cota de gênero, determinando a cassação dos registros de candidatura, a nulidade dos votos e a recontagem dos quocientes eleitoral e partidário. No entanto, ao reavaliar o conjunto das provas, o MPE destaca que a federação não violou o percentual mínimo de 30% de candidaturas femininas, pois cumpriu integralmente o requisito no momento do registro da chapa.
Segundo o parecer, a candidatura de Ladjane Patrícia da Silva, uma das investigadas, foi registrada em vaga remanescente, após o prazo regular. Isso significa que sua inclusão não alterou o cálculo do percentual de gênero definido inicialmente. Dessa forma, ainda que a candidata tenha apresentado indícios de campanha inexpressiva, sua participação não pode ser usada como fundamento para considerar que a federação descumpriu a cota.
O MPE é explícito ao afirmar:
“Requerimento de registro de candidatura para vaga remanescente não interfere no percentual da cota de gênero, razão pela qual não houve descumprimento da cota pela Federação PSDB/Cidadania.”
Esse entendimento marca uma distância significativa da sentença original, que havia equiparado as condições da federação e do AGIR, aplicando as mesmas penalidades a ambas as legendas. Para o Ministério Público, essa equiparação não encontra respaldo jurídico e nem fático.
Divergência entre irregularidade individual e fraude estrutural
O MPE reconhece que a candidata da federação apresentou elementos que, em outros contextos, poderiam sugerir candidatura fictícia: votação de apenas três votos, ausência de atos de campanha e contradições em depoimentos. No entanto, a legislação e a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) distinguem claramente entre fraude à cota de gênero, que é estrutural e afeta o DRAP do partido, e irregularidades individuais, que não necessariamente produzem efeitos sobre toda a chapa.
Assim, ainda que haja indícios de inconsistência pessoal na candidatura de Ladjane, o Ministério Público entende que tais indícios não se estendem à federação como um todo, que apresentou número suficiente de mulheres para atender à lei. Isso impede, segundo o órgão, que se mantenha a cassação de todos os candidatos da federação, bem como dos votos que ela recebeu.
Fraude no AGIR é considerada comprovada pelo Ministério Público
Se o parecer do MPE é favorável à federação, o mesmo não pode ser dito em relação ao AGIR. O órgão sustenta que há provas robustas, convergentes e incontestáveis de que o partido utilizou candidaturas femininas fictícias, violando o art. 10, §3º, da Lei das Eleições.
Votação irrisória e ausência de campanha
As candidatas Míriam Lima dos Santos e Nilza Maria dos Santos obtiveram, respectivamente, zero e quatro votos, números que, aliados a outros elementos, reforçam a inexistência de campanha real. Não foram apresentadas fotografias, vídeos, registros de redes sociais ou qualquer tipo de material comprovando atos de campanha.
O MPE também observa que, embora materiais gráficos tenham sido emitidos em nome das candidatas, não há evidências de que esses materiais tenham sido distribuídos, levantando suspeita sobre sua real finalidade.
Depoimentos sugerem pagamento para que mulheres aceitassem registrar candidatura
O parecer destaca ainda depoimentos de filiados do próprio partido, como Edmílson Correia de Souza e Josué Borges Leandro, que relataram discussões internas sobre a necessidade de apresentar uma candidata mulher apenas para cumprir a exigência legal. Em seus depoimentos, ambos afirmaram que houve oferta de pagamento para que Míriam aceitasse se candidatar, reforçando a tese de fraude.
A candidata Míriam, por sua vez, apresentou depoimentos contraditórios, ora afirmando que fez campanha, ora admitindo que desistiu informalmente da disputa. As inconsistências, somadas à ausência de provas materiais e à votação zerada, foram consideradas decisivas pelo Ministério Público.
Elementos alinhados à Súmula 73 do TSE
O Ministério Público lembra que a Súmula 73 do TSE considera que a fraude à cota de gênero pode ser reconhecida quando presentes:
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votação zerada ou inexpressiva;
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ausência de movimentação financeira ou prestação de contas padronizada;
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inexistência de atos de campanha.
Segundo o órgão, todos esses elementos estiveram presentes no caso das candidatas do AGIR.
Manutenção das penalidades aplicadas ao AGIR
Diante desse quadro, o MPE defende a manutenção integral da sentença para o partido AGIR. Isso inclui:
cassação do DRAP do partido;
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cassação dos diplomas dos eleitos pela legenda;
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nulidade dos votos;
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recontagem dos quocientes eleitoral e partidário;
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declaração de inelegibilidade dos envolvidos diretamente na fraude.
Impactos potenciais da decisão do TRE-PE
Se o TRE-PE seguir o entendimento do Ministério Público:
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A Federação PSDB/Cidadania manterá seus votos e seus eleitos;
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O AGIR poderá ter todos os seus votos anulados, o que pode alterar a composição da Câmara Municipal de Escada;
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Envolvidos diretamente na fraude podem se tornar inelegíveis por oito anos.
A decisão final caberá ao plenário do TRE-PE, que ainda analisará os recursos apresentados.
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