A filiação de Ciro Gomes ao PSDB reacende debates sobre seu papel na reconstrução da centro-direita e sua possível candidatura presidencial em 2026.
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| PSDB aposta em Ciro Gomes para recuperar relevância. Ciro aposta no PSDB para voltar ao jogo. Foto: Jarbas Oliveira/Folhapress |
Por: Sanchilis Oliveira.
Ciro Gomes nunca foi um político previsível — e talvez por isso continue sendo relevante mesmo após sucessivas derrotas eleitorais. Sua filiação ao PSDB, em outubro de 2025, foi recebida com surpresa, ironia e desconfiança, mas carrega um cálculo frio por trás do gesto. O Ceará pode ter sido o palco, mas o espetáculo é nacional.
A verdade é que Ciro não voltou para ser governador, voltou para ser lembrado — e, quem sabe, para ser presidente. Já o PSDB não o recebeu por afinidade ideológica, e sim por sobrevivência. Depois de anos em decadência, os tucanos enxergam em Ciro um “gerador de manchetes” com diploma, verbo e recall popular. Em tempos de redes sociais e polarização extrema, isso vale mais do que coerência.
O voo dos tucanos e o retorno do “Ciro combativo”
Desde a derrota de 2018, o PSDB perdeu espaço, identidade e voto. O partido que já governou o país virou uma legenda órfã, dividida entre apoiar o bolsonarismo ou tentar reconstruir a imagem de centro. Ciro, por sua vez, passou os últimos anos isolado, criticando a esquerda, o PT e o próprio sistema político — um personagem fora de casa.
Essa união, portanto, é menos ideológica e mais estratégica. O PSDB precisa de um nome que fale grosso, que ocupe manchetes e que devolva o partido ao noticiário político. E Ciro precisa de um abrigo partidário com estrutura nacional, tempo de TV e máquina política. A simbiose é óbvia: um busca fôlego, o outro busca palco.
Um casamento de conveniência
Nos bastidores, fala-se que Ciro poderá disputar a presidência do PSDB antes mesmo das eleições, com Tasso Jereissati cogitado para o governo do Ceará.
Mas o que realmente importa aqui é o tabuleiro. Ciro volta a um partido que o viu nascer politicamente — mas também o viu partir, há três décadas, por divergências estratégicas.
Agora, o reencontro é puro pragmatismo: Ciro quer disputar a narrativa da centro-direita, um espaço hoje fragmentado entre o PL de Bolsonaro e o União Brasil, que ainda busca identidade.
Para o PSDB, ressuscitar um nome como Ciro é tentativa de reposicionar-se como partido da razão, da moderação e da crítica técnica — uma imagem que o ex-ministro consegue sustentar com brilho retórico.
Mas há riscos: Ciro carrega uma taxa de rejeição elevada e o estigma de derrotas sucessivas, algo que o eleitor de centro pode não perdoar.
Quem usa quem?
A pergunta que ecoa nas redes e nos bastidores é direta: quem está usando quem?
O PSDB, que tenta se reinventar, usa Ciro para voltar às capas de jornal. E Ciro usa o PSDB como trampolim para o Planalto. Ambos sabem disso. Ambos fingem não saber.
Essa dinâmica revela a essência da política brasileira contemporânea — onde as alianças se movem menos por coerência programática e mais por sobrevivência tática.
O eleitor que acredita que Ciro voltou ao PSDB para disputar o governo do Ceará ainda está preso à pauta local. O olhar mais atento percebe que o movimento é de reconfiguração nacional.
A disputa pelo Palácio do Planalto em 2026 já começou — e Ciro quer ser o nome da “nova direita moderada”, aquela que não se identifica nem com o bolsonarismo, nem com o petismo, mas com o discurso da competência técnica.
O discurso que vende, o risco que pesa
Ciro é um político que apanha e volta, como se o conflito fosse combustível. Cita Adam Smith, critica Keynes, provoca Lula e desdenha Bolsonaro — tudo no mesmo parágrafo.
É o caos com método. E é justamente isso que o PSDB busca: alguém que cause barulho sem parecer radical, que tenha apelo nacional, mas discurso racional.
Por outro lado, há o risco de o partido perder a própria identidade. Se Ciro dominar a narrativa, o PSDB pode deixar de ser o abrigo da moderação para se tornar o palco da verborragia.
A história já mostrou que Ciro é maior que as legendas que o abrigam — e isso pode ser tanto um trunfo quanto uma maldição.
Ceará é o cenário, Brasília é o objetivo
Quando Ciro fala em “reconciliação nacional”, ele não está pensando na política cearense — está mirando o Brasil.
A reaproximação com Tasso Jereissati e o PSDB é parte de um plano que busca recolocar o centro político no jogo nacional. Se vai dar certo, é outra história.
Mas ignorar o movimento seria ingenuidade. Há cálculo, há método e há ambição.
O PSDB precisa de Ciro para renascer. Ciro precisa do PSDB para voltar ao jogo. É um pacto de conveniência que pode salvar ambos — ou sepultá-los juntos.
No fim, a filiação de Ciro Gomes ao PSDB é mais simbólica do que eleitoral. Representa uma tentativa de reconstrução de espaço político em meio a um país que vive de extremos.
Se o projeto prosperar, pode reabrir o debate sobre racionalidade política no Brasil. Se fracassar, será apenas mais um capítulo da longa história de ressuscitações frustradas da centro-direita.
De um jeito ou de outro, Ciro está de volta — e o PSDB, pela primeira vez em muito tempo, voltou a ser notícia.
Agora resta saber se o reencontro entre o pragmatismo e a necessidade renderá votos… ou apenas boas manchetes.
Ciro não voltou ao PSDB para disputar o Ceará, voltou para disputar a narrativa.
A pergunta que não quer calar é: quem está usando quem?
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