STF decide que vice que substituir chefe do Executivo afastado por decisão judicial pode disputar reeleição. Tema terá repercussão geral.
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| STF decide que vice pode disputar reeleição após substituição. Foto: Rosinei Coutinho/STF |
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por maioria de votos, que o vice que substituir o chefe do Poder Executivo — presidente, governador ou prefeito — nos seis meses anteriores à eleição, em razão de afastamento judicial do titular, não fica impedido de concorrer a um segundo mandato consecutivo.
A decisão foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1355228, com repercussão geral reconhecida (Tema 1.229), o que significa que o entendimento servirá de referência para outros casos semelhantes em todas as instâncias da Justiça Eleitoral.
O caso analisado: oito dias no cargo
O processo tem como protagonista Allan Seixas de Sousa, atual prefeito de Cachoeira dos Índios (PB), que teve o registro de sua candidatura à reeleição indeferido em 2020. O motivo foi o fato de ele ter ocupado o cargo de prefeito por oito dias em 2016, entre 31 de agosto e 8 de setembro, período inferior a seis meses antes da eleição.
A Justiça Eleitoral local entendeu que, ao exercer o cargo dentro do período de vedação, mesmo que por poucos dias, o vice estaria buscando um terceiro mandato consecutivo, algo proibido pela Constituição Federal.
No recurso ao STF, Seixas argumentou que a substituição ocorreu por determinação judicial, sem que houvesse sua participação na causa do afastamento do titular, e que não praticou atos de gestão relevantes durante o curto período no cargo.
O voto do relator e a maioria formada
O relator do caso, ministro Nunes Marques, sustentou que substituições ocasionais e involuntárias — especialmente quando derivadas de decisões judiciais — não devem gerar inelegibilidade.
Segundo o ministro, a regra constitucional sobre reeleição busca evitar o uso da máquina pública em benefício próprio, o que não se aplica a situações em que o vice apenas cumpre uma ordem judicial.
“A substituição involuntária, por curto período, não configura exercício efetivo do mandato para fins de reeleição”, afirmou Nunes Marques durante o voto.
Acompanharam o relator os ministros Cristiano Zanin, André Mendonça, Alexandre de Moraes, Luiz Fux e Gilmar Mendes, formando maioria no plenário.
Divergências sobre o prazo máximo
Embora tenha havido consenso quanto à natureza involuntária da substituição, o prazo máximo para que ela não gere inelegibilidade dividiu os ministros.
Devido a essa divergência, a fixação da tese final de repercussão geral — que orientará a aplicação do entendimento nas instâncias inferiores — será feita posteriormente, após definição sobre o prazo.
Argumentos contrários: vedação constitucional
A divergência foi aberta pelo ministro Flávio Dino, que votou contra a possibilidade de reeleição em casos de substituição, ainda que breve. Para ele, a Constituição e a Lei Complementar nº 64/1990 (Lei das Inelegibilidades) estabelecem de forma clara que o exercício do cargo dentro dos seis meses anteriores ao pleito gera impedimento.
“O texto constitucional não distingue sucessão de substituição. Há uma vedação expressa para qualquer exercício do cargo nesse período”, defendeu Dino.
O ministro destacou ainda que o legislador impôs esse limite justamente para preservar a isonomia nas eleições. Ele foi acompanhado pelos ministros Cármen Lúcia, Dias Toffoli e Edson Fachin.
Impacto e repercussão nacional
A decisão do STF tem repercussão geral, ou seja, passará a servir de referência obrigatória para casos semelhantes em todo o país. A medida traz segurança jurídica e padroniza o entendimento da Justiça Eleitoral sobre reeleição de vices que assumem o cargo de forma temporária por determinação judicial.
Especialistas em direito eleitoral avaliam que a decisão reforça a importância de distinguir substituição involuntária de sucessão política, evitando interpretações que possam restringir o direito de candidatura de forma desproporcional.
No entanto, também há quem veja risco de flexibilização excessiva das regras de elegibilidade, o que poderia abrir brechas para interpretações divergentes nas instâncias regionais até a fixação definitiva da tese pelo STF.
Contexto constitucional
De acordo com o artigo 14, §5º da Constituição Federal, “o presidente da República, os governadores de Estado e os prefeitos, e quem os houver sucedido ou substituído no curso dos mandatos, poderão ser reeleitos para um único período subsequente”.
O debate jurídico gira em torno da interpretação desse dispositivo: se a substituição eventual — especialmente quando imposta pela Justiça — configura ou não exercício do cargo para fins de reeleição.
Com a decisão recente, o STF sinaliza que a vontade do agente político e a natureza da substituição devem ser consideradas na análise da inelegibilidade.
A decisão do Supremo Tribunal Federal representa um passo importante na definição dos limites da reeleição no Executivo, especialmente em situações de afastamento judicial do titular.
Embora o julgamento tenha resolvido o caso concreto do prefeito Allan Seixas, o entendimento definitivo sobre o prazo máximo de substituição ainda será fixado em nova sessão.
Até lá, a decisão majoritária indica que vices que assumem involuntariamente o cargo nos seis meses antes da eleição não podem ser penalizados com inelegibilidade — uma interpretação que busca equilibrar o respeito à Constituição com o princípio da razoabilidade.

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